terça-feira, 8 de setembro de 2009

UM BICHO DE ESTIMAÇÃO

O que ia na frente, montado no burrão de passo duro, era primo dos dois que iam ali, bem atrás.
Desses dois, um montava um pangaré sadio e o outro um jumento tão minúsculo, que, pra chamar atenção, nem precisava ser tão enfeitado. Bastava seu montador apoiar os pés no chão que o bicho saía andando, passando por entre as pernas do peão.
Naquele sertão alagoano não tinha jumento menor nem mais bonito, tampouco mais enfeitado – já que por ser o menor e mais bonito, tinha de ser o mais enfeitado, já que era o jeito de seu dono mostrar por ele seu amor.
Até as putas se avexavam de ciúme.
Ali, os três faziam farra.
Cada um levava na cintura o que acreditava ser sua defesa.
Eles se riam de tudo: do torrão de terra na frente da areia branca, do cara-cará espreitando a tarde, da cachaça que o turco ia tentar trapacear.
O que ia na frente parou: Tirou o 22 da cintura e, rindo, bem que fez pontaria, mas foi atropelado pelo outro, que já tinha sacado seu 32, limpo e azeitado na noite anterior...
Quem pediu licença pra atirar foi o do jumento.
Ele, não fosse o jumento, era respeitável apenas pelo trabuco. Sabe aqueles trabucos que se carregam pela boca? (um pouco socado de pólvora, mais um pouco socado de chumbo granulado, um pouco socado de paciência - já que essa coisa explode até no tratamento).
Os dois, dos três, arredaram braço, sinalizando que era a vez indubitável deste terceiro, já que tinha a arma mais antiga, a que mais trabalhara na defesa de sua família (desde seu bisavô).
Um largato, de uns dois quilos, num pé de pau, tomava a fresca do fim de tarde.
Ele sacou do trabuco, descansou pontaria.
Apoiando o cotovelo na testa do jumento manso, enfeitado e cheiroso como o quê, sentindo uma satisfação que, com certeza, era reservada a poucos, apertou o gatilho.
Antes do lagarto se mexer, do susto provocado pelo estampido, o atirador, em pé, chorou ao ver seu jumento inerte, cabeça sangrando, se embolar sob seus pés: o tiro saiu pela culatra...

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